terça-feira, 29 de novembro de 2011

Aventura 26: A Ilha Wight, Ano 499


Ano 499 D.C. Logres continua cercada pelos Reinos saxões. O inverno tem matado aos montes os servos e nobres mal alimentados. As estradas estão avariadas devido as cheias dos rios descongelados. Sem ouro é difícil fazer as obras necessárias para mantê-las transitáveis. Leva-se quase o dobro de tempo para se chegar aos destinos pois os caminhos estão alagados e as pedras das antigas estradas romanas se deslocaram formando buracos que machucam as montarias. A busca pelos doze tesouros da Britânia continua já que é a única esperança de expulsar o invasor saxão. De todos os lados os reinos inimigos pressionam Logres por mais tributos. Não há mais solução pacífica e o conflito é eminente nas fronteiras de Logres.

Castelo de Sarum:

O conselho está reunido mais uma vez. No grande salão do castelo de Sarum todos estão sentados à grande e longa mesa de carvalho, com o brasão de Sarum esculpido no centro. Os archotes iluminam as paredes de pedra cinza e as tapeçarias que retratam a batalha de Saint Albans decoram o lugar. Estão presentes Sir Amig, Sir Berethor, Sir Verius, Sir Lycus, Sir Dylan, Sir Dalan, Sir Léo, Arina e Sir Bag. Canecos de hidromel circulam enquanto os heróis aguardam a Condessa Ellen.

Sir Amig: “Então garotos! Quer dizer que naufragaram na costa de Thule verão passado?”

Barão Algar: “Sim. Não foi nada agradável...”

Sir Dylan: “Soube que Syan morreu irmã.”

Lady Marion: “Foi muito triste.”

Sir Berethor: “Eles tem morrido muito cedo... É uma pena. Perdemos muitos deles nos últimos anos. Desse jeito o número de Cavaleiros irá diminuir consideravelmente.”

Sir Verius: “É verdade. Mas... Quer dizer que Merlim deixou a ilha e Avalon parece cada vez mais distante? Não tivemos mais notícias de Nineve. Dizem que Glastonbury está com os portões fechados pelos padres da Abadia de José de Arimatheia.”

Sir Lycus: “Mas meu amigo, Merlim sequestrou o filho de Igraine e dizem que o filho do falecido Madoc também foi raptado por ele! Secretamente o velho deve odiar os Pendragons.”

Barão Algar: “Não acredito nisso. Talvez ele tenha desejado protegê-los.”

Sir Lycus: “Duvido. Vocês pensam que Merlim é amigo? Ao velho só interessa seus Deuses e Avalon. Não esqueçam que o filho do demônio causou mais problemas para o reino do que ajudou. Ou vão me dizer que não foram manipulados pelos interesses deles?”

Sir Enrick: “Talvez os interesses de Avalon e os nossos sejam os mesmos Lycus.”

Sir Léo: “E o Rei Idres da Cornualha? O seu poder está enorme. Suas forças continuam marchando do sul para o norte e conquistando cidade por cidade. Logo baterá as portas de Salisbury.”

Sir Bag: “Sim, o filho mais velho do conde Tegfan veio aos meus salões pedindo ajuda. O condado de Jagent (Condado situado ao norte da Cornualha) está sendo invadido pelo Rei do oeste. Dizem que o conde mandou queimar todas as plantações e casas, matou os animais e trancou-se em sua fortaleza em Ilchester. Nada disso parece barrar Idres, infelizmente não podemos ajudar ninguém. Estamos com a corda no pescoço tanto quanto os outros lordes. Não acham?”

Todos os Cavaleiros concordam com Bag.

Sir Léo: “Enquanto Sir Enrick, Lady Marion e o Barão Algar foram levar Merlim para a Terra dos Francos fomos falar com Duque Ulfius, como a Condessa Ellen determinou. Ele foi bastante receptivo. Mas não conseguimos falar com Ælle. Ele nos mandou a seguinte mensagem: “Vocês, malditos celtas não são de confiança. Tenho interesse em conversar com vocês mas na hora apropriada e com a pessoa certa. Aí talvez possamos ter um acordo. Em breve mandarei uma mensagem e quero que Sir Enrick seja o seu embaixador.”

Sir Bag: “Por que diabos esse Rei saxão que falar com você guri?”

E todos olham espantados para Sir Enrick.

Sir Enrick: “Não sei nem como começar... Há 3 anos meu pai, Gondrik Stanpid veio até mim e revelou uma história assustadora. Minha mãe, na Época que Ælle chegou na ilha, foi capturada como escrava pelos saxões e o rei bárbaro a tomou como sua amante. Ela foi submetida à vontade do rei a força. Mas aí ela se apaixonou por um outro escravo celta que servia as estrebarias de Ælle: Gondrik Stanpid. Então arquitetaram um plano de fuga e foram embora de Sussex. Mas minha mãe carregava uma criança em seu ventre, filho do Rei saxão. E essa criança era... Eu.”

Um silêncio sepulcral invade o salão. Todos ficam boquiabertos.

Sir Amig: “Genro! Sei que já fez muito por todos. Mas... Terá que daqui para frente cuidar com cada passo que der para não acabar em uma forca.”

Barão Algar: “Porque não nos contou antes?”

Sir Enrick: “Não sabia a reação que teriam.”

Lady Marion: “Marido! Você seguirá outro Rei? Um saxão desgraçado?”

Sir Enrick: “Nunca! Sou Celta! E protegerei nosso povo como sempre fiz e jurei. E contem comigo para negociar com o Rei Bárbaro.”

Todos agem com certa frieza depois da notícia.

Sir Amig: “Tenho notícias dos únicos homens que estão lutando nessa guerra.”

Barão Algar: “Quem?”

Sir Amig: “A Resistência Celta porra! Sacas e mais sacas de aveia, cevada, nozes, frutas desidratadas, carnes e peixes salgados capazes de diminuir a fome nos feudos de Salisbury consideravelmente foram deixadas em meu feudo. Ao lado de 250 cabeças de gado, 38 ovelhas e 45 porcos.”

Barão Algar: “Isso é ótimo! Alguém soube de algo que tenha acontecido?”

Sir Amig: “Parece que foi num feudo ao sudeste de Sarum. Ali existia uma torre, a Pedra do Bispo, que todos acreditavam estar abandonada. Parece ter ocorrido uma grande explosão de fogo grego no último ano varrendo as terras e queimando tudo ao redor. Sei que os suprimentos vieram daí porque o bilhete que foi deixado pela Resistência mencionava algo à respeito.”

Barão Algar: “Fogo grego me parece trabalho dos saxões. E quem estaria fazendo isso? Quem teria o preparo adequado?”

Sir Amig: “Não sei quem seria louco o bastante para isso. Só sei que tem funcionado.”

Então a porta de trás do trono se abre e a Condessa Ellen entra seguida de um rapaz. Ele tem cabelos pretos e curtos. Ele veste uma cara armadura composta de ferro e por cima uma túnica amarela com uma brasão vermelho com as três cabeças de leão, símbolo da Cornualha. Uma capa de pele de leão lhe cobre as costas e uma espada de duas mãos, com uma garra do felino esculpida na empunhadura, pende de sua cintura. Debaixo do seu braço ele leva um elmo em formato de cabeça de leão. Seis lanceiros com o mesmo brasão pintado em seus escudos o escoltam com capas amarelas.

Condessa Ellen: “Boa tarde Cavaleiros! Fico feliz que vocês tenham retornado com vida de Thule. Deixe-lhes apresentar. Este é o Príncipe Mark, Filho do Rei Idres, senhor da Cornualha.”

Sir Amig: “Este brasão não era de Gorlois, Príncipe?”

Príncipe Mark: “Sir Amig, não é? Pois então. Depois de usurpar as nossas terras Gorlois passou a adotar essa cota de armas e nos obrigou, sobe a lâmina da espada, a mudar o nosso, foi uma desonra para a minha casa, pois nos tornamos Vassalos do Conde morto por Algar. Por isso essa Cota de Armas é minha de direito e com o meu pai se tornando o Rei do oeste novamente, voltamos a usar nossos velhos símbolos. Mas não estou aqui para dar explicações. Senhores e senhoras, venho em nome de meu pai, Rei Idres, lhes trazer uma proposta de uma aliança. Apesar de já ter tido uma recusa no passado.”

Ele olha para Sir Enrick com um olhar de reprovação.

Príncipe Mark: “Os reis saxões estão competindo um contra o outro. Se tivermos sorte também matarão uns aos outros. Os três reis bárbaros, Rei Aethelswith, Rei Cerdic e Rei Ælle tem algo em comum, se odeiam com todas as forças. Então, o que posso dizer na frente de mulher tão bela quanto a Condessa. Somente ela poderá salvar Logres. Pensei na possibilidade de poder desposá-la senhora.”

Ele vai até a Condessa Ellen pega em uma de suas mãos e a beija. Ela tem uma reação extintiva e a puxa rapidamente. O Príncipe Mark dá um pequeno sorriso irônico para ela. Os heróis percebem que Sir Léo parece encolerizado.

Condessa Ellen: “Príncipe, me pegou de surpresa. Essas coisas não são decididas da noite para o dia. Nem lhe posso dar uma resposta, assim, sem consultar o meu conselho.”

Príncipe Mark: “Quero uma resposta agora. Estou lhes fazendo um favor. Não estão em posição de negociar. Saibam que o exército de meu Pai marchou contra Jagent e conquistou castelo por castelo até chegar a cidade de Ilchester. O Conde resistiu enquanto pode. Mas quando os moradores da cidade começaram a morrer como moscas ele se rendeu e mais uma parte de nosso território foi expandido. Logo estaremos marchando para Salisbury e se não tivermos um acordo não lhes posso garantir nada.”

Sir Enrick: “A Condessa acaba de lhe dizer que não tem interesse em se casar.”

Barão Algar: “Não force a situação homem. É a Condessa que deve decidir e ela disse não.”

Lady Marion: “Quem é você para impor amor à uma mulher.”

Príncipe Mark: “Casamento não é para ser consumado por amor. Esse conceito é primitivo. Casamentos são para se fazer alianças e manter nossos povos seguros, Mi Lady.”

Sir Amig se levanta olhando nos olhos do Príncipe.

Sir Amig: “Escute aqui rapazinho. A Condessa disse que precisa pensar. Não se pode tomar tudo a força. Melhor, saia já daqui seu barra bosta. Cansamos de ameaças vindas de todos os lados.”

Príncipe Mark: “Acalme-se velho. Já estou de saída. Talvez tenha o prazer de ter as suas cabeças em lanças em cima dos muros de Sarum. Aliás com a nova muralha construída será um prazer derrubá-la com os nossos trebuchets. A sua cabeça será a primeira, velho. Pensem bem, é melhor uma aliança com um nobre britânico do que com um Rei saxão.”

Ele cospe no chão e dá as costas se retirando e colocando o seu elmo na cabeça. Seus lanceiros o seguem.

Sir Amig: “Isso vá embora! Dá próxima vez que nos encontrarmos talvez não tenha mãos para colocar o elmo em sua cabeça.”

Conselho de Guerra:

Condessa Ellen: “Depois dessa proposta estranha de casamento e dessa demonstração de carinho por parte do Príncipe é hora de conversarmos à respeito dos nossos inimigos bárbaros. Recebi o Arauto do Rei Saxão Cerdic há uma semana. Como não pagamos tributo no último ano ele exige que nos tornemos seus vassalos. Se não o fizermos Salisbury será queimada, o povo morto e todos os nobres enforcados. Mas... acredito que chegou a hora de Cerdic provar de seu próprio veneno, pois pretendo evitar por enquanto uma aliança com algum outro Rei Saxão.”

Sir Berethor: “Condessa e Cavaleiros. Temos poucos homens disponíveis. Teremos que pensar em algo diferente para lidarmos com essa situação. Três de meus soldados relataram movimento nas fronteiras de Logres. Temo que Cerdic já esteja se movendo.”

Sir Amig: “Sim, por isso, a Condessa teve uma ótima idéia durante o inverno."

Condessa Ellen: “O que é isso Sir Amig, foi o senhor que teve essa idéia. Perigosa, arriscada, mas no momento que vivemos... Necessária.”

Sir Amig: “Isso mesmo senhora. Me respondam garotos, qual o ponto fraco de qualquer pai?”

Barão Algar: “Os filhos!”

Condessa Ellen: “Exato! Lembram quando o Barão encontrou aqueles Cavaleiros da ilha Wight que foram conquistados pelo Rei saxão Cerdic? Pois bem, alguns deles fazem a proteção de Igraine na Abadia de Amesbury. Uther era aliado do Rei Leodegrance e o irmão da Rainha deste Rei é o líder destes homens.”

Sir Dylan: “Mas essa ilha está sobe o domínio do filho do Rei bárbaro, Cynric.”

Sir Amig: “Isso mesmo! O Algar não tem um barco? O Bag também? Atravessamos o estreito e desembarcamos em Wight. Invadimos o castelo e sequestramos o maldito Príncipe usando a escuridão.”

Condessa Ellen: “Com ele em nossas mãos Cerdic não terá coragem de nos atacar e muito menos de nos cobrar tributos.”

Sir Lycus: “Vocês estão loucos! Perderam a razão? Isso será uma declaração de guerra contra o Rei inimigo. Não participarei dessa loucura. E se não der certo? ”

Sir Léo: “Sir, você não é forçado a nos seguir. Mas não admitiremos que nos atrapalhe.”

Sir Lycus toca o osso de Santo Albano, prendendo o seu cabelo, se levanta e sai sacudindo a cabeça e pisando forte com as suas esporas de pratas fazendo um som forte no chão de pedra até deixar o salão.

Sir Bag: “Xi você magoou o homem.”

Sir Dylan: “Problema dele. Pai, primeiro precisamos de um destes cavaleiros de Wight que possam nos guiar dentro da ilha. O problema é como convencer Igraine. A rainha nos odeia.”

Sir Enrick: “Ela nos quer mortos!”

Condessa Ellen: “Está certo Cavaleiros! Preparem seus homens e tripulações. Antes gostaria que Lady Marion, o Barão Algar, Sir Enrick, Sir Bag, Sir Dalan e Sir Amig fossem falar com Igraine. Em dois dias reúnam as suas forças no portão oeste e partam para Donchester com a benção dos Deuses novos e antigos.”

Sir Amig: “Vocês ouviram garotos mexam-se esses traseiros! Temos trabalhos a fazer!”

Barão Algar: “Antes de encerrarmos, gostaria de convidar a todos os integrantes da Ordem dos Cavaleiros da Cruz do Martelo e a Condessa Ellen a participarem de um banquete em minhas terras, em Winterbourne Gunnet, na véspera de nossa jornada. Será uma ocasião especial.”

Todos confirmam que irão comparecer na Toca do Lobo, o Motte and Bailey do Barão, e se despedem.

A Abadia de Amesbury:

Imediatamente eles partem do castelo descendo a rampa de paralelepípedos que leva a cidade. O trabalho da muralha foi concluído. Ao redor do castelo e de Sarum ela se ergue em pedra cinzenta, nova em folha. Os brasões do Conde Robert tremulam acima delas. A cidade com poucos habitantes está tomada pelo barro e mau cheiro. Os heróis seguem pelo portão leste e rumam para o norte margeando o Rio Avon. A relva está bem verdinha e as flores tomam os campos. O comércio é inexistente e não se vê ninguém caminhando pelas trilhas. Surge uma ponte romana à frente, eles atravessam e logo a Abadia pode ser vista próxima ao rio. Os muros cercam o lugar, que na época dos romanos era um templo dedicado a Deusa Tellus, uma divindade da natureza. Uma torre de madeira foi erguida do lado de dentro e um lanceiro, com um elmo pontudo com o brasão azul com um castelo e dois cavalos marinhos de cada lado (Brasão da ilha Wight) cozido em sua túnica, os observa.

Lanceiro: “Alto! O que querem?”

Sir Bag: “Tem comida aí meu bom lanceiro?”

Sir Enrick: “Viemos falar com a Rainha Igraine. Diga que é urgente.”

Sir Amig: “Abram essa porra de porta de uma vez! Não temos o dia inteiro homem. Mexa essa bunda branca e rápido.”

O lanceiro sacode a cabeça em sinal de desaprovação.

Lanceiro: “Um minuto senhores irei falar com o Abadessa.”

O grupo aguarda meia hora quando finalmente o portão de madeira duplo se abre. Outros dois Lanceiros escoltam o pequeno grupo. Lá dentro alguns gansos e galinhas andam pelo pátio de terra e a grande construção com janelas em ogiva e o crucifixo no alto parece ser bem antiga. Na primeira sala de pedra iluminada por velas, decorada com tapeçarias contando a paixão de Cristo e com uma mesa quadrada de salgueiro no centro, uma freira velhinha os aguarda.

Abadessa Aldyth: “Ah, são vocês? Eu lembro muito bem de você mocinha! Aquela cusparada no meu rosto serviu para lembrar que o mau e o pecado original se esconde na beleza onde se menos espera. Deixem as armas em cima da mesa. A Rainha Igraine os aguarda na capela. Lembrem-se que é proibido derramar sangue em solo sagrado. Sigam-me.”

Barão Algar: “A Senhora é corajosa de falar com Marion desse jeito.”

A freira não dá atenção à eles.

Sir Bag fala baixinho para Marion: “A velha não te perdoa menina de ouro.”

Eles entram em uma capela. Existe um altar de pedra com uma grande cruz. Os archotes nas paredes lançam as suas sombras. Cinco bancos longos de cada lado preenchem o salão. A bela Igraine está ajoelhada em frente à uma imagem de Maria esculpida em pedra. De pé ao lado esquerdo dela, com a cabeça baixa e com as mãos cruzadas vestindo a sua túnica azul por cima da cota de malha, está Sir Cinnor. O Cavaleiro deve ter uns cinquenta verões e tem cabelo curto e branco. No lado direito o Arcebispo Dubricus com o seu cabelo abajur preto e liso, debaixo de seu solidéu roxo e suas roupas vermelhas com o seu rosto já demonstrando a velhice, olha para os heróis com escárnio.

Arcebispo Dubricus: “Espero que tenham vindo em paz Cavaleiros. Das últimas vezes que nos encontramos nunca demonstraram civilidade e bradavam uma arma cheia de sangue e uma alma pagã cheia de rancor.”

Sir Amig: “Quieto seu maldito papa garotos! Eu vou lhe enfiar a mão na cara!”

Sir Bag já vai erguendo um banco longo pra acertar a cara do Arcebispo.

Barão Algar: “Esperem! Seu desgraçado... Fique calado, eu não esqueci o que nos fez sua víbora maldita. Ninguém encoste um dedo no maldito. Esse padreco é meu!”

Então Igraine se levanta e grita.

Igraine: “Todos, tenham respeito por esse chão sagrado. Gerações cultuaram os deuses aqui. Olhem para essa imagem. Antes esse lugar era o bosque sagrado da Deusa. Os Romanos derrubaram e enforcaram os Druidas nos Carvalhos que o cercavam e depois o puseram abaixo com machados. Depois eles ergueram o templo para a deusa Tellus, a deusa da natureza e centenas e até milhares de pessoas a cultuavam. E agora convertidos, a nova crença cultua Maria, a mãe do Cristo, nesse mesmo lugar.”

A Rainha parece estar desequilibrada e melancólica.

Arcebispo Dubricus: “Mas veja Rainha, agora o lugar está purificado, longe das abominações desses não convertidos.”

Barão Algar: “Mais um piu e lhe arranco a cabeça.”

Igraine fica olhando séria para a imagem de Maria no altar e logo depois sorri docemente.

Igraine: “Vejam Cavaleiros! Vocês conseguem enxergar? O bosque sagrado continua vivo. Aqui continua sendo a casa da Deusa. A grande mãe ainda vive nesse chão. Ela não nos abandona.”

Arcebispo Dubricus: “Senhora!”

Ela faz um gesto e o Bispo se cala na hora.

Igraine: “Mas... O que os trazem aqui?”

Barão Algar: “Precisamos de sua ajuda Rainha. Sei que tivemos nossas desavenças mas Salisbury depende disso. Estamos na eminência de sofrermos um ataque do Rei saxão Cerdic e só existe uma maneira de barrá-lo... Sequestrando o seu filho.”

Igraine: “Vocês tem experiência nisso, não é? É estranho que vocês queiram minha ajuda depois de tudo o que aconteceu. Uther sempre falava que sem vocês não existiria Logres. Na verdade minha irmã talvez tenha mais culpa que vocês no meio da confusão que foi o desaparecimento de meu filho.”

Barão Algar: “Sua irmã, Senhora?”

Igraine: “Vocês não sabem não é? Nineve! A grande sacerdotisa de Avalon. Por isso ela me ajudou a fugir na nevasca do castelo de Uther quando estávamos impedidos pelo Rei de ir embora aquela noite. Mas como tudo que se faz à Avalon, se paga à Avalon, um dia, tal ato benevolente, me foi cobrado. Eu teria que gerar a criança que seria o sucessor de Uther, o protetor de Avalon e seus preceitos. Então, me recusei a deixar Gorlois. Era um homem bruto, não entendia muito de mulheres, mais com o tempo eu aprendi a amá-lo. Sempre foi um pai carinhoso e mais velho começou a compreender o meu coração. Aí Merlim e Uther me enganaram, e isso foi o início do fim de tudo.”

Arcebispo Dubricus: “Falsos deuses sempre promovem falsas promessas senhora.”

Sir Enrick pega o bispo pelo cangote e o sacode fazendo voar o seu pequeno solidéu vermelho. Ele se prepara para aplicar um soco na cara do Arcebispo quando vê Igraine abaixar a cabeça e as lágrimas molharem o chão de pedra da capela.

Igraine: “Mas está certo. O pouco que sobrou de nossa terra foi graças a vocês terem a mantido viva. Uther estava certo. Sir Cinnor peço para que acompanhe esses heróis e os ajudem.”

Dubricus fica calado com os olhos ardendo de ódio.

Sir Cinnor: “Claro minha Rainha! Como desejar.”

Igraine: “Mas gostaria de lhes pedir uma coisa em troca. Eu conto com poucos Cavaleiros para me protegerem. Toda a nobreza virou as costas para mim depois da morte de Uther. Perdi dois maridos, fui jogada de um lado ao outro, mas a culpa sempre é das mulheres nesse mundo. Nossa sina filha de Avalon. Eu precisarei no futuro que me ajudem e lhes peço quando forem chamados que honrem com o compromisso aqui firmado.”

Barão Algar: “Honraremos, Sua Graça. Pode contar conosco.”

Sir Enrick: “Sempre fomos fiéis a seu marido, Rei Uther, e ao seu enteado, Príncipe Madoc e seremos à senhora. Se um dia seu filho aparecer, lhe seremos fiéis também.”

Igraine: “Obrigado! Que Maria esteja com vocês.”

Então enquanto o grupo se retira da capela a rainha começa a gritar.

Igraine: “Esperem! Eu tive uma visão numa destas noites! Vi meu filho Arthur, adulto, cavalgando pelas charnecas da Britânia e um cavaleiro com o rosto de Madoc cavalgando ao seu lado. Vi castelos brotarem do chão como flores e um grande salão com uma mesa redonda de pedra. Vi um cálice e um caldeirão e eles estavam cheios de sangue.”

Então Igraine começa a chorar e a repetir: “Eu vi, eu vi, eu vi.” e a se balançar enquanto as freiras entram e a confortam levando-a para o seu quarto.

Os heróis saem da capela e aguardam no pátio principal depois de pegarem as suas armas novamente. Sir Cinnor e seu escudeiro prepararam seus cavalos e pertences para partirem.

Sir Bag: “Igraine está lelé da cabeça.”

Barão Algar: “Não me parece que esteja louca. Ela deve estar prevendo algo já que o Caldeirão é o principal tesouro da Britânia.”

Sir Amig: “Concordo, a mulher teve os seus problemas Bag.”

Sir Dalan: “Tenho nove filhos e mais uma dúzia de bastardos. Se perdesse qualquer um deles seria como perder um pedaço de minha alma.”

Sir Amig: “O que vocês acharam desse favor que ela pode nos pedir?”

Sir Enrick: “Isso me assusta. Melhor nem pensar nisto.”

Então os Cavaleiros partem em seus cavalos cada um para o seu feudo para fazerem a preparação de seus exércitos. Sir Cinnor parte com Sir Amig em direção a Tishea.

Dinton:

Dinton essa época do ano está cheia de flores e as montanhas que se erguem por fora da muralhas estão verdes com só os picos cobertos de neve. Os falcões voam acima no céu azul. Nesse ano o feudo melhorou e mais ouro sobrou com a recusa de se pagar os tributos aos saxões. Muitos aldeões continuam doentes mas existe novamente a esperança dada por Merlim e os doze tesouros da Britânia. As pessoas parecem animadas com a perspectiva de enfrentarem o inimigo novamente.

Em uma urna de vidro em cima do altar da igrejinha, próxima à vila, a Sanctu Gladius é cultuada pelos cristãos. Inclusive muitos milagres de cura foram atribuídas a espada que pertencia ao São Paulo. Sir Enrick e Marion estão na entrada da igrejinha que foi construída com quatros paredes simples de madeira, com bancos longos sem encosto e um simples altar com uma cruz feita de dois troncos de salgueiro. O povo faz uma fila e entra para tocar a lâmina da Sanctu Gladius.

Padre Carmelo: “Lady Marion e Sir Enrick! Que honra! Vieram ver a espada milagreira?”

Lady Marion: “Sim padre! Belo trabalho.”

Padre Carmelo: “Todo esses aldeões com esperança novamente. Isso nos ajudará um bocado. Mas tenho que lhes confessar algo. Tenho medo que algum fanático roubem-na. Por isso a verdadeira gladius está bem escondida. Ninguém tem coragem de chegar perto das tumbas dos cavaleiros Sine Nomine. Ela está lá em uma delas. Inclusive, minha senhora, existem rumores de que à noite a Caveira Negra surge e treina com os homens que já se foram. Dizem que nem grama cresce ali. Nada que um pouco de óleo fervente não resolva durante a madrugada.”

Oswalt com o seu bebê no colo: “E a caveira quem se disfarça Padre?”

Padre Carmelo: “Não sei meu rapaz. Nunca pedi à alguém que fizesse isso.”

Bernard e Ellen vem correndo abraçar seus pais. Atrás apoiado em um cajado Gondrik, pai adotivo de Sir Enrick, vem sorrindo.

Bernard: “Senhor... Pai? Soube que vão lutar.”

Sir Enrick: “Vamos sim...”

Bernard: “O Vô está me ensinando a cuidar dos cavalos! É muito legal!”

Ellen: “Eu também. Mãe e Pai! O Bernard me ensinou a atirar com o arco!”

Lady Marion: “Isso filha! Muito bem!”

Gondrik Stanpid: “Filho e nora! Que alegria! Sabe as crianças estão aprendendo rápido. A próxima campanha é perigosa e vocês tem crianças pra criar. Tragam Oswalt vivo por favor. Já perdi muita coisa para esses saxões desgraçados.”

Sir Enrick: “Farei o máximo que puder pai.”

Lá na área de treinamento dos soldados, próximo as cabanas construídas para eles morarem com as suas famílias, a movimentação é grande, enquanto os armeiros limpam as espadas, preparam as lanças. As flechas vão sendo feitas com cuidado uma a uma. O ferreiro Caradoc, sogro do irmão de Sir Enrick, desentorta elmos e conserta as armas rachadas e embotadas de outras campanhas. As cotas de malhas são roladas em barris cheias de areia para serem limpas e depois remendadas com novos aros.

Sargento Wistan: “Senhora e senhor Stanpid os homens estão ansiosos para lutar novamente. E querem ser escolhidos a todo custo. Soube que não levaremos cavalos. Os barcos não são próprios para o transporte de montarias. Quantos homens levaremos?”

Sir Enrick: “Escolha os melhores! Não mais que seis. Iremos no máximo em sessenta homens. Cada cavaleiro da Ordem levará esse número.”

Winterbourne Gunnet:

No feudo do Barão Algar, as árvores estão carregadas de frutas. Os aldeões as colhem em cestos sobe a supervisão de seus homens de armas. O roubo devido a fome tem feito cair muito a produção. As mortes das crianças recém nascidas e dos velhos continuam altas mas o ânimo parece melhorar quando eles vêm os guerreiros prepararem suas armas e equipamentos de guerra. Sargento Tegfryn, Hagen, o comandante do novo barco de Algar ganho na Dinamarca, o antigo comandante Dwyfor, sem um dos braços perdido na última campanha, Arina, a princesa Dinamarquesa guerreira, Sir Verius e o Barão Algar conversam animadamente.

Dwyfor: “Então chegamos em Saint Albans e o Barão e o Flecha ligeira estavam no meio de um caos de fogo. Aí a menina de ouro correu para o barco. Entramos na cidade e lá dentro o pau comeu e a guerreira foi ferida. Mas quando chegamos no alto da muralha não teve pra ninguém. Botamos o inimigo pra correr com flechas como tarado em noite de Beltane.”

Sargento Tegfryn: “Foi épico mas morreram muitos heróis naquela tarde quente.”

Sir Verius: “Inclusive Urco por uma noite. Não sei como ele apareceu depois e sobreviveu.”

O cachorro pula pedindo carinho

Hagen: “Quero ver como esses Britânicos lutam no mar! Sempre é o mais difícil e o mais perigoso.”

Arina: “Eu também. Mas esse calor da ilha é ruim demais. Como aguentam ficar dentro de uma armadura com esse verão maldito?”

Sargento Tegfryn: “Barão! Estamos tentando preparar o mais rápido possível suas tropas!”

Então Brian vem correndo. Com os cabelos longos ruivos e sardas no rosto, o menino com nove anos vem vestindo a túnica com o brasão dos Herlews. Os mastins, martelo e trovão, já ficando com os pelos do focinho branco, andam ao lado dele. O garoto carrega uma espada de madeira na cintura e o pingente da espiral celta de Avalon no pescoço.

Brian: “Pai, vai ter guerra?”

Barão Algar: “Sim filho.”

Brian: “Meu sonho é assistir uma! Me leva junto por favor!”

Barão Algar: “Deixa eu pensar... NÃO!”

Brian: “Ah pai! Hagen me levou navegar pelo Rio! Ele está me ensinando a andar em cima das pás dos remos. É verdade que uma vez você caiu do barco em uma corredeira?”

Barão Algar: “Ah bem, sabe...”

Brian: “É verdade ou não pai?”

Barão Algar: “É...”

Brian: “Que demais! E você ficou com medo de morrer?”

Barão Algar: “Medo não é bem a palavra certa.”

Adwen chega ali perto do cercado de areia onde os homens treinam, próximo ao poço de pedras. Ela está com trinta e duas primaveras e os primeiros cabelos brancos surgem em sua cabeça. A Baronesa se aproxima e abraça o Barão.

Adwen: “Brian, sei que você está empolgado mas deixe o seu pai trabalhar. Você terá tempo para fazer a guerra. Sir Amig já disse que quando voltarem irão para Tishea começar o treino para Pagem. Até lá tenha paciência. Diga para ele Algar.”

Barão Algar: “Isso mesmo rapazinho.”

Brian: “Droga! Pelo menos deixem eu ajudar o sargento a preparar as coisas!”

Sargento Tegfryn: “É um bom garoto Barão, deixe ele me ajudar! Falando nisso, quantos homens e unidades levaremos senhor?”

Barão Algar: “Está certo! Pode ajudá-lo! Levaremos 3 piqueiros e 2 peles de lobo Tegfryn.”

Brian fica feliz da vida e sai pulando atrás de Tegfryn.

Hagen: “Senhor! Os barcos estão prontos e aguardam no Rio Avon, já que Hantonne está dominada por Cerdic. Mesmo assim acredito que este rio deva estar bloqueado à algumas léguas daqui. Poderemos partir ao amanhecer.”

Banquete:

Ao anoitecer os convidados começam a chegar pra o banquete proposto ao Barão, no salão de Winterbourne Gunnet. Todos os Cavaleiros da Ordem da Cruz do Martelo chegam escoltando a Condessa Ellen convidada de honra da festa. Ao som de alaúdes e flautas, os membros da Ordem da Cruz e do Martelo comemoram o fim de mais uma campanha no salão da Toca do Lobo. A comida não é tão farta quanto no passado, mas ainda assim se divertem com quedas de braço, jogos e dança.

O barão Algar Herlews está em seu adornado trono de madeira, ao lado da baronesa Adwen. Ao se lado, estão Sir Enrick e sua esposa Marion, recebidos com certa frieza pelos convidados depois da revelação de que o Flecha Ligeira é meio saxão.

Arina: “Mais um perna de javali pra mim, e traga mais hidromel também!”

Com os lábios brilhantes de gordura e dentes sujos. Apesar dos sete canecos derramados sob a mesa ele não aparenta estar embriagada. Sir Bag comenta baixinho para Sir Enrick.

Sir Bag: “Essa é mulher é uma bárbara guri!”

Então o Barão bate com o talher em um prato, mas pouco se viram para ele. Bate com mais força, mas a bagunça generalizada é mais audível. Ele pega uma grande jarra a sua frente, a sacode, se certificando de que ela está vazia, e arremessa para o outro lado do salão, estilhaçando na parede e quase acertando o pobre Bjork que servia Sir Verius de mais pão e carne. Todos se viram para o barão, que sorri satisfeito, erguendo os braços.

Barão Algar: “Senhoras e senhores, membros da Ordem da Cruz e do Martelo! Essa festa hoje não é somente para comer e beber as custas do ouro do rei dinamarquês, mas para congratular aqueles que são bravos em batalha! Eu não estaria aqui comendo e peid... E cheio de saúde hoje, se não fossem por vocês, grandes cavaleiros, que tantas vezes me ajudaram em campanha contra nossos inimigos. Todos vocês são ordenados cavaleiros, e não tem esse ‘Sir’ antes do nome à toa! No entanto, um dos mais bravos membros desse seleto grupo jamais recebeu título algum, e ainda assim luta como um gato selvagem, com força, agilidade e esperteza! É graças a esse grande guerreiro que voltamos com glória, ouro e aliados do estrangeiro. E hoje, desfarei essa grande injustiça!”

Algar se levanta, olha para Lady Marion.

Barão Algar: “Faça a gentileza de se ajoelhar diante de seu suserano, sim?”

Ele saca sua espada, raramente usada em batalha, e entoa com orgulho enquanto a Filha de Avalon se ajoelha com o rosto surpreso.

Barão Algar: “Lady Marion de Tishea Stanpid, você jura diante de teu senhor e pela espada por mim empunhada, a sempre lutar pela glória de Logres, pelos deuses dessa terra e pelo seu rei?”

Lady Marion: “Sim!”

Barão Algar: “Jura manter a tradição sagrada da cavalaria, amando seu rei, sua família, sua honra e hospitalidade?”

Lady Marion: “Eu juro!”

Barão Algar: “Jura lutar com bravura e força contra os inimigos da Bretanha sempre que isso lhe for solicitado?”

Lady Marion: “Sim!”

Barão Algar: “Então, pelos poderes a mim concedidos, lhe condecoro como Valkyria da Bretanha, Senhora das Batalhas e Espírito da Sabedoria. Que seu exemplo faça florescer nas mulheres dessas terras o espírito guerreiro que levará Logres e toda a Bretanha à vitória contra os malditos saxões. Que assim seja para todo o sempre! Lealdade, Força e Honra!”

Todos os Cavaleiros repetem o lema da Ordem dos Cavaleiros da Cruz do Martelo e prestam reverência a guerreira. Depois a abraçam chamando-na de irmã.

Condessa Ellen: “Parabéns Lady Marion! É a primeira mulher investida na Cavalaria Britânica. Você merece guerreira. É uma honra tê-la em nossas forças.”

Encontro em Sarum:

Ainda, nessa mesma madrugada, as tropas dos Cavaleiros da Cruz do Martelo partem de seus feudos para se encontrarem à sombra da muralha de Sarum com as últimas estrelas no céu azul escuro. A Condessa Ellen os aguardam com dez lanceiros da cidade de Sarum.

Condessa Ellen: “Que bom todos vieram. Cavaleiros! Essa jornada será perigosa. Talvez a mais mortal aventura que já participaram. Sei que muitos de vocês não retornarão e que os estou olhando pela última vez. Mas desde os nossos ancestrais é necessário realizar feitos, às vezes, além de nossas forças. A única maneira de fazermos a diferença é irmos até o inimigo e pegarmos o que queremos. No final de tudo isso não esqueçam que Salisbury poderá ser um lugar melhor se conseguirem concluir essa tarefa. Boa sorte e que os deuses novos e antigos estejam com vocês! Adeus!”

Então a pequena força com 60 homens marcha pela margem do Rio enquanto os dois barcos seguem com as provisões e arqueiros mais atrás.

Sir Amig: “Atenção comandantes. Entraremos em território dominado por Cerdic. Se avistaram algo dentro da floresta de Camelot nos avisem imediatamente. Batedores sigam nos flancos e vanguarda.”

Sir Bag: “Qual o nome do seu novo Barco Algar? O meu com o aríete na proa se chama Marlim. Sugestão do Flechinha.”

Sir Amig: “Todos para o fundo?”

Sir Dalan: “Destroços?”

Barão Algar: “Muito engraçado vocês! Se chamará Heiling. O nome de minha filhinha que ficou em Sauvage.”

Todos aprovam o nome dado a embarcação. Sir Enrick segue liderando os batedores. Já é meio dia quando eles entram na floresta. Os guerreiros ouvem somente o cantar dos pássaros, a água corrente do rio e a marcha dos soldados carregando seus escudos nas costas. Eles marcham no meio da mata abafada por algumas horas e então escutam um chifre de alerta soar.

Um dos batedores se aproxima. Um dos rapazes dos Ventos do Pântano vem da vanguarda, carregando um saco de couro de foca, em direção a Sir Enrick.

Weylin: “Sou Weylin meu senhor! Achamos esses três saxões na margem do Rio (ele retira com as unhas sujas de terra uma das cabeças que levava no saco). Tivemos que matá-los antes que descobrissem que nossa força inteira viria por aqui.”

Noite na Floresta de Camelot:

O dia vai passando e eles param uma vez no meio da tarde para comerem um pouco de pão preto com queijo e rapidamente seguem viagem para o Sul até o cair da noite. O acampamento é montado em círculos e os sentinelas guardam o perímetro ao redor. Fogueiras, bebidas e cantorias foram estritamente proibidas. O céu acima de suas cabeças está com milhares de estrelas e a lua brilhante reflete nas águas do rio. Os dois barcos estão encalhados na margem barrenta com sentinelas os guardando. Os batedores continuam fazendo seu trabalho noite adentro. Os heróis estão sentados em troncos longos, colocados como bancos e conversando, enquanto tomam um pouco de hidromel e observam as estrelas.

Sir Amig: “Já pensaram o que vamos fazer com o Príncipe quando pusermos as mãos no maldito?”

Sir Berethor: “Temos que levá-lo à um lugar seguro. Capturar o nobre será a única maneira de evitarmos uma guerra.”

Sir Enrick: “Que tal espalharmos alguns saxões em diversos lugares, como reféns falsos. Isso confundiria o inimigo. Nunca saberiam onde estaria o filho de Cerdic realmente.”

Sir Amig: “Perfeito meu rapaz.”

Barão Algar: “Mas diga Sir Cinnor, como vamos entrar na fortaleza inimiga?”

Sir Cinnor: “Lhes guiarei pelos túneis embaixo da castelo de Carisbrooke mas não temos como saber onde o Príncipe está. Existem três túneis por debaixo da fortaleza. Nossos soldados eram chamados de fantasmas, o orgulho de Wight, pois surgiam atrás do inimigo quando estávamos sobe cerco. Na verdade eram essas passagens que permitiam que nós atacássemos sem sermos vistos.”

Sir Bag: “Muito engenhoso! Aprendi essa palavra com Carmelo.”

Sir Dalan: “Temos que esperar Cavaleiros e Saxões lutando juntos contra nós. Isso é que me preocupa.”

Sir Cinnor: “O problema é que não sabemos o que nos aguarda lá embaixo. Podem estar cheios de sentinelas. Esses desgraçados criam gigantes, tem fogo grego, as armadilhas da própria fortaleza, a água do mar. Todo cuidado é pouco, não é fácil lutar em meio a escuridão em um labirinto onde dois homens mal conseguem lutar lado a lado com o inimigo conhecendo o território.”

Sir Amig: “Iremos pelos túneis e se conseguirmos pegá-los de surpresa e invadirmos o castelo teremos uma boa chance. Vou ser realista, se algo acontecer com um grupo, o outro deve prosseguir.”

Sir Verius: “Tudo terá que ser feito as escondidas! Se o inimigo perceber seremos encurralados e ninguém sairá vivo.”

Vem a madrugada e Sir Enrick, Algar e Marion vão dormir na tenda de comando de Algar. O sono é agitado. Sonhos com um sensação claustrofobia em corredores baixos e estreitos e a água do mar invadindo tudo e afogando todos os seus homens na escuridão ficam se repetindo a noite toda. Já Marion sonha com algo diferente...

Sonho Marion:

Marion vê o lago de Glastonbury coberto de brumas e parece voar como um pássaro entrando nas brumas e saindo em um pântano depois dele. Existem dezenas de caminhos por entre o lodo negro. Ela vê Nineve sentada olhando fixamente para o fogo em uma sala de pedra. Ela tem a lua azul tatuada na testa. Ela fala: “É você Marion? Seja bem vinda filha. Venho lhe dizer que os tesouros deverão ser reunidos para Excalibur renascer. Porque ela é a espada dos Deuses celtas guerreira. A espada existe, mas sua a sua essência não está no nosso mundo. Sempre que é necessário "limpar a terra da maldade humana" uma alma enviada pelos deuses encarna e a ela é entregue a espada sagrada. Excalibur foi forjada pelo próprio Goibhniu, no começo do nosso mundo. Terminada a missão, a espada retorna ao seu lugar, do outro lado das Brumas. E o seu sangue guerreira a carregará para lá.”

Então todos acordam pela manhã com o som de vozes fora da tenda. Três batedores conversam com o rosto fechado com Sir Amig, sem o peitoral de aço, com ar preocupado coçando a barba branca.

Sir Amig: “Uma guarnição de Cerdic bloqueia a saída do Avon. Precisamos mandá-los para o inferno. (Ele atira para Sir Enrick um alforje de sidra) Cavaleiros da cruz do martelo... É com vocês.”

Weylin (batedor): “Sir Enrick, eles tem um pequeno porto na margem e uma corrente de um lado ao outro. Vi 3 tendas e quatro sentinelas. Eles tem cachorros também.”

Sir Amig: “Garotos, eles não podem saber que somos um exército cruzando pelas suas terras. Nenhum deve escapar! Voltem inteiros para o almoço!”

Barão Algar: “Está certo! Vocês ouviram vamos! Venha Arina.”

Sir Bag: “Se levar a grandona vão ter que me levar também!”

Sir Dalan: “Todos os Cavaleiros da Cruz do Martelo querem ir Algar!”

Barão Algar: “Está certo venham! Como nos velhos tempos rapazes!”

Então o pequeno grupo com 10 Cavaleiros se desloca pela mata em silêncio. Após uma hora de caminhada eles escutam conversas na beira do rio e sentem cheiro de comida. Sir Enrick segue em frente sozinho. O Flecha Ligeira se esgueira e observa. Dali ele pode ver as 3 tendas feitas de couro de gado. Quatro homens conversam na beira do rio com seus escudos e espadas deixados de lado ao redor de um caldeirão de comida fumegante pendente em um tripé. Eles riem enquanto comem com as mãos em pratos de madeira. Dois pastores alemães estão deitados junto à eles entretidos com os restos de comida. Sir Enrick escuta.

Saxão: “O problema é que os outros desgraçados dos Reis Saxões se odeiam. Sinto o cheiro de guerra no ar amigos.”

Então o Cavaleiro retorna.

Sir Enrick: “A margem do rio está da maneira que os batedores informaram. Marion pegue seus dez arqueiros e use a mata. Posicione os dez ao redor do acampamento em formação de ferradura. Eu estarei com você. Algar e os Cavaleiros da Cruz do Martelo depois de nossos disparos corram lá para dentro e matem tudo que se mexer.”

Então Marion conduz os arqueiros em total silêncio. Quando estão todos posicionados os cachorros começam a latir.

Saxão: “Calma garotos, o que foi?”

Então Marion ordena o ataque e as flechas alçam vôo. Os quatro saxões e os cachorros são mortos instantaneamente sem dar um gemido. De dentro das tendas saem vários guerreiros inimigos. Eles gritam quando vêem os outros mortos. Alguns estão sem armaduras e umas prostitutas cobertas com peles de urso saem de lá pra ver o que está ocorrendo e voltam para a tenda quando percebem que trata-se de um ataque. Os bárbaros tentam desesperadamente achar seus escudos e armas.

Arina: “É um pra um!”

Barão Algar: “Atacar!”

Os Cavaleiros da Cruz do Martelo correm aos berros com as suas armas em riste. Algar gira para o lado desviando da lança de seu inimigo e a puxa com o machado desequilibrando-o. Enquanto isso Lady Marion e Sir Enrick cospem flechas matando dois saxões que correm sem entender o que está acontecendo. Algar é atacado novamente enquanto o bárbaro cospe na sua cara tentando o confundir. A lança ponte aguda novamente vem e ele se abaixa alguns centímetros esperando o momento certo para acertar um golpe de baixo para cima com o seu grande machado de guerra abrindo o seu adversário desde a virilha até o pescoço, espalhando todas as suas tripas na terra.

Próximo à uma das tendas Sir Dalan absorve um forte golpe de machado com as suas duas espadas, gira por trás de seu inimigo e rasga a garganta de um guerreiro ruivo segurado de joelhos pelos cabelos. Arina empurra um homem com o pomo de seu martelo de guerra. Ele cai com a cabeça em uma pedra pontiaguda. Com o martelo de guerra a guerreira explode a cabeça dele espalhando pedaços de cérebro por todos os lados.

Sir Bag olha para os heróis enquanto outro saxão se debate segurado pelo gorjal de couro em suas mãos: “Acho que vou me apaixonar por essa garota.” Arina fica vermelha. Então Bag quebra o pescoço de seu inimigo, tão fácil quanto se faz com uma galinha, tentando impressionar a princesa Dinamarquesa. Perto da margem Sir Dylan decapita um saxão com a sua espada e o seu corpo inerte se ajoelha e cai dentro do rio.

Sir Enrick: “Não podemos deixar ninguém para trás. Essas prostitutas tem que ser passadas no aço agora.”

Prostituta: “Não, tenham piedade! Queremos viver!”

Então uma delas em desespero corre e Sir Enrick a acerta com uma flechada nas costas matando-a instantaneamente. As outras gritam e choram.

Barão Algar: “Não podemos matá-las Enrick! Homens levem-nas amarradas para o acampamento. Deixem que Sir Amig decida o que fazer com elas.”

Após acharem trinta libras e retirarem a corrente que bloqueava o Rio Avon eles retornam para o acampamento.

Sir Amig: “Como foram com os desgraçados? Pelo visto bem, trouxeram até mulheres peladas com vocês. Se livrem delas, matem-nas, façam alguma coisa! Não temos como levá-las.”

Então sobe o comando de Sir Enrick os soldados levam as mulheres e com gritos desesperados seguidos de um profundo silêncio eles as executam na mata.

Sir Amig: “Ótimo! Sigamos em frente! Vamos bando de vagabundos!”

Então eles continuam a marchar pela mata. Os barcos são desencalhados e os acompanham à distância. A pequena força passa pelo local onde a guarnição saxônica estava e seguem até o estuário do Avon. Logo à frente do alto de uma falésia verdejante eles vêem o mar cinza e o céu azul se encontrando no horizonte. A longa ilha Wight pode ser vista ao fundo. Os barcos estão lá embaixo e encalham na praia para a milícia subir.

Sir Amig: “Vamos, 30 homens em cada barco. Rápido, temos que retornar ainda esta noite.”

Todos vão subindo à bordo enquanto a tarde vai se aproximando do fim.

Dwyfor: “Vamos aguardar a maré subir senhor.”

Os barcos então cheio de guerreiros. Todos usando as suas cotas de malha, elmos, espadas, flechas e botas com proteção para os tornozelos. Finalmente as ondas começam a quebrar no costado e em meia hora o Marlim e o Heiling flutuam novamente.

Então os barcos giram em uma perfeita coreografia e apontam contra a arrebentação. Sir Amig toca a espiral tríplice pendurada no pescoço e começa a ficar marejado. Urco, também enjoado, apoia o queixo na perna do veterano. A arrebentação bate de encontro ao casco. Os barcos levantam nas ondas e caem do outro lado. O vento sopra forte e o sol se pondo no final da tarde ilumina o céu claro de dourado.

As grandes velas com o brasão de Algar e na outra o de Bag, com o falcão verde no campo amarelo, se enchem de vento e os navios entram no alto mar escuro. Os pássaros marinhos voam no alto enquanto eles observam alguns peixes saltarem fora da água. Aos poucos o sol vai se pondo. As estrelas vão surgindo no céu e a temperatura cai um pouco. A ilha vai se aproximando. Pode ser visto o contorno da alta falésia ao fundo.

Sir Verius: “Peguei um pouco de terra, ajuda a esconder nossas caras brancas do brilho da lua. Querem?”

Ele pega um pouco de água do mar que entrou no barco e misturam a terra. Ele vai passando até que seu rosto fique bem camuflado. Todos imitam o Cavaleiro Celta. Na escuridão todos ficam em silêncio. Nenhuma lanterna é acesa dentro do barco. Os barqueiros se guiam pelas luzes de fogueiras acesas na Ilha.

Barão Algar: “Essa ilha é um pedaço de rocha! Espere... Mais a leste existe uma faixa de areia.”

Os barcos rapidamente atingem a arrebentação e surfam nas ondas. Dwyfor bate três vezes no costado e os remadores sabem que é hora de recolher seus remos. Logo eles atingem a praia encalhando na areia branca de Wight.

Hagen: “A maré irá descer e levará algum tempo até subir novamente e o barco flutuar. Talvez algumas horas. Alguém ficará senhor?”

Sir Enrick: “Dez guerreiros! Os mais novos. Fiquem e protejam.”

Sir Amig pula com água na cintura e os outros os seguem. É difícil de se equilibrar. Alguns homens caem e outros os ajudam a se levantar evitando se afogarem por causa do peso das cotas de malha. Quando todos chegam na areia da praia eles observam a faixa litorânea antes da alta falésia. Logo percebem que existe uma aldeia de pescadores ali próxima. As janelas das palafitas estão abertas. Eles podem escutar alguns cachorros latirem e vêem luzes das lanternas acesas dentro delas. É necessário atravessá-la para se chegar na trilha que leva acima das falésias.

Sir Amig: “Estão vendo? É uma vila de pescadores ali. Olhem as canoas encalhadas na praia.”

Sir Cinnor: “Antes costumava ser uma vila celta. Mas com a invasão não posso dizer com certeza.”

Sir Berethor: “O problema é que eles podem nos descobrir fácil com esse céu limpo e a lua cheia. Como todos passando por ali será impossível não nos verem.”

Arina: “O que quer que façamos? Invadimos? O que está olhando gordão? Tá com medo?"

Sir Bag: “É que você é meio... bruta.”

Arina só levanta seus ombros indiferente.

Sir Enrick: “Invadimos e matamos todos.”

Barão Algar: “Já era hora de termos essa conversa. Não concordo! Já vi e matei desse jeito e levo essas mortes em minhas costas, em meus sonhos. Não queiram passar por isso.”

Sir Amig: “Assumirá a morte dos nossos soldados que nos seguem fielmente se os pouparmos?”

Barão Algar: “É preciso arriscar para se fazer a coisa certa. A Honra deve prevalecer sobe o assassinato.”

Sir Enrick: “Se alguém fugir ou tentar algo estaremos todos mortos.”

Então todos os Cavaleiros votam e a decisão é poupar os aldeões.

Barão Algar: “Cerquem a aldeia! Não deixem que escapem. Acendam tochas quando ela estiver sobe cerco.”

Então o Barão Algar, Sir Bag, Lady Marion e Sir Enrick vão até o centro da vila. Sentem o cheiro de peixe assado e escutam conversas em céltico e algumas em idioma saxão. Ouvem vozes de crianças. Algar escolhe uma da cabanas, sobe uma pequena escada de madeira de três degraus e arromba com um chute a porta. Na pequena casa uma mulher nova loira, um homem ruivo e uma criança estão sentados à uma mesa. Eles se levantam assustados. Todos estão desarmados e vestindo túnicas marrons esfarrapadas.

Algar percebe que o homem é saxão, a mulher não. Eles estão desarmados.

Saxão: “What is that?” (O que é isto?)

A mulher grita e se encosta na parede de madeira com a criança atrás.

Saxão: “Shut up woman!” (Calada mulher!)

Sir Enrick pula no pescoço do homem e o imobiliza o silenciando.

Mulher: “Meu senhor não nos mate, por favor! Eles nos obrigam a viver com eles. Nós pescamos para alimentar os saxões do castelo e eles tiveram filhos conosco.”

Sir Enrick: “Mate os homens Algar! Vamos!”

Lady Marion: “Mas poupe as mulheres e as crianças. Levamos todas até os barcos e as deixamos sobe vigia.”

Barão Algar: “Boa idéia Marion.”

Wistan vem carregando um saxão pelos cabelos. O bárbaro está com um corte profundo no braço.

Sargento Wistan: “Barão, esse aí tentava fugir pela praia! O que faço com ele?”

Barão Algar: “Invadam as casas e matem todos os bárbaros, só poupem as mulheres e crianças!”

Os gritos de medo e pedidos de clemência, quando as casas são arrombadas, são carregados pelo vento para o mar. Seguido pelos sons de aço cortando carne e de vasos e copos de cerâmica sendo quebrados. A morte veio dançar em Wight. Pode se ver o braço de um corpo caído pela porta aberta de uma casa. Um homem com as costas quebradas caído na areia, morto, quando tentava fugir e seu cachorro o puxando pela túnica. Uma palma de mão impressa em sangue na parede da cabana. Corpos jazem na areia tingindo-a de vermelho. Seis guerreiros aliados morrem na vila.

Depois de escoltarem as mulheres e as crianças prisioneiras até os barcos os heróis e seu pequeno exército sobem a falésia pela trilha atrás da vila. A areia atrapalha a caminhada. No alto o campo verde se estende à frente e um grande bosque de carvalhos pode ser visto. Um castelo em uma colina no centro da mata se ergue no meio da mata. Dá para se ver em contraste com o brilho da lua cheia, sentinelas andando por entre as ameias.

Sir Cinnor: “Sigamos pelo bosque! Venham, as entradas ocultas ficam lá!”

Eles caminham pelo campo por pelo menos meia hora. Tudo está em silêncio e a lua cheia os guia. Eles percebem os elmos de seus homens e as armas brilhando levemente em meio a mata mergulhada na escuridão. Se escuta o som leve de caminhada. Todos estão tensos e em silêncio total. Então eles parecem ouvir algo e todos param instintivamente. Todos ficam nervosos se olhando com o coração acelerado. O som vem se aproximando, até que um bando de cachorros do mato correm assustados. Algar respira aliviado.

Eles continuam a marcha, passam por entre três carvalhos antigos e embaixo do terceiro, que cresce junto à um pequeno morro por entre a mata, Sir Cinnor vai até uma pedra muito antiga que parece estar ali à milênios.

Sir Cinnor, em vão, tenta mover a pedra. Sir Bag e Arina vão ao seu auxílio e os dois a rolam com facilidade. Uma entrada quadrada existe atrás dela e um túnel estreito mergulhado na escuridão, com não mais que um metro de altura. Um cheiro ruim emana dali de dentro.

Sir Cinnor: “Temos que entrar rastejando. Depois teremos mais espaço, não muito, mas melhor do que esse.”

Arina: “Ai meu Odim! Você falou em água... Eu não sei nadar!”

Sir Baga fala baixinho: “Eu sabia que essa aí ia arregar uma hora dessas.”

Sir Cinnor: “Calma Arina, só terá água se eles nos descobrirem.”

Então, um a um, todos vão se arrastando se sujando de terra. Alguns com o rosto no chão e outros roçando a cara no teto baixo. Os primeiros acendem tochas do outro lado. Sir Bag quase não consegue passar mas ele tira a armadura e depois de meia hora veste ela novamente. De cueca de pele de lontra ele chega do outro lado.

Arina: “Você podia ir assim Bag, chegue na frente gritando, o castelo inteiro correria para o mar.”

Sir Amig: “Silêncio!”

O túnel permite que se fique de pé, mas os guerreiros mais altos ficam arcados. As paredes são de calcário e dá para se caminhar dois a dois. Algumas tochas são acesas ao longo da linha e em alguns lugares mergulhados na escuridão os soldados se guiam colocando a mão no ombro do homem que está a sua frente. As paredes são irregulares escavadas há muitos anos com picaretas. Está abafado, deve fazer perto de quarenta graus, e os guerreiros sentem o rosto e as costas cheias de suor dentro das armaduras. Sir Cinnor segue em frente. Ele vai observando e iluminando o caminho com a tocha. A água que pinga do teto dá a impressão que vai apagá-la fazendo um chiado. Eles andam naquele lugar mal cheiroso e sentem algo em seus tornozelos. Quando iluminam vêem dezenas de ratos se esgueirando pelos cantos.

Eles caminham e sentem que hora o túnel curva para um lado, após algum tempo vira para outro. O silêncio é total. Somente o som dos homens caminhando no chão de pedra ecoa no subterrâneo. Então Sir Cinnor para por um instante.

Sir Cinnor: “Estão escutando?”

Arina: “Hvad fanden!” (Que merda!)

À frente o túnel se bifurca. Sir Cinnor, faz sinal para que fiquem quietos. A ordem passa de homem para homem. Então ele aponta para a esquerda e eles seguem por ali. Depois surgem mais quatro passagens e o Cavaleiro de Wight os guia por uma das passagens sem demonstrar insegurança. Depois as possibilidades vão aumentando, existem passagens laterais. Todas mergulhadas na escuridão total. Não dá para se distinguir muito os caminhos. Então o som que eles ouviram começa a crescer. Ele vai aumentando e ecoando pelos túneis.

E lá atrás da fila eles avistam primeiro um clarão e depois escutam seus homens gritando. Um coro de vozes urram. E aí começam os de pânico e depois os de dor. A fila virá uma bagunça com todos tentando olhar para atrás. Mas ela é grande. Os gritos de homens morrendo e de aço cortando a carne continuam assustadoramente pelos túneis e duram por longas batidas do coração. Então... Lá atrás as tochas se apagam.

Tudo fica mergulhado no breu e em silêncio novamente. O cheiro de sangue fresco e de merda invadem os túneis fazendo muitos vomitarem. Os soldados começam a entrar em pânico.

Soldados: “Meus deus! Vamos sair daqui!”, “Rápido! Todos na parte de trás foram mortos!”

Então o clarão lá atrás é visto novamente.

Soldados: “Eles estão voltando! Ajudem por favor, aju...! Arrrrrgghhhh!”

E aí o pânico se espalha pela fileira e cada homem ao mesmo tempo tenha sacar a sua arma. Um pisa no outro e se empurram. Alguns caem e a gritaria e a matança continua. É impossível ver o que está acontecendo lá atrás. Desesperados e com medo de serem mortos muitos saem da fila e começam a se espalhar pelas passagens adjacentes. Os heróis vêem por um desses túneis laterais espadas de fogo grego passando por essas passagens adjacentes. Armas e elmos brilham pelo reflexo do fogo. São centenas e a luz é forte como se mil sois estivessem acesos.

O som da batalha nos túneis se espalha por todo subterrâneo. Pode se ver as tochas de seus homens se apagando. Eles vêem a sombra na parede projetando um homem de joelho tremendo com as mãos levantadas e sendo traspassado por uma espada no meio da garganta. Então a luminosidade fica intensa e as espadas de fogo surgem de todos os lados os cegando pela claridade. O pior, eles não sabem de onde vem os golpes nem com quem estão lutando.

Algar em um vislumbre percebe que os homens usam um elmo de ferro negro com peles os cobrindo e dois chifres saindo fogo grego incandescente queimando inclinados na direção de seus olhos. Eles lutam com espadas curtas, ideais para se combater em um espaço apertado.

Então o inimigo cai sobre eles com sede de sangue. Eles se escondem na escuridão e surgem golpeando por todos os lados. Depois desaparecem para logo depois surgirem do outro lado. Eles urram e fazem barulhos horripilantes e com a luminosidade extrema os heróis não sabem quantos nem de onde são desferidos os golpes. Algar é atingido várias vezes nas costas. Ele é bastante ferido. Mas, no espaço apertado, tenta acertar algo. Ele vê um elmo caindo e girando no chão impulsionado pelas espadas de fogo grego e o som de um gemido enquanto quebra a cabeça de um inimigo de encontro a parede.

Barão Algar: "Acho que matei um!"

Sir Enrick tomado pelo frenesi da batalha grita: “Horsaaaaa!”

Ele gira por cima da cabeça o seu martelo de guerra em meio ao mar de luz incandescente. Ele sente esmigalhar ossos e alguns golpes fortes lhe atingindo. Marion também usa seu martelo e golpeia. A Filha de Avalon cega pela luminosidade gira rapidamente de um lado. Depois ataca do outro, com os seus sentidos a toda. Até que algo dá errado e ela tropeça caindo com o rosto no chão em meio aos ratos e sua arma some no meio da confusão.

E então ela vê uma cena estarrecedora: Sir Cinnor, com a perna amputada do joelho para baixo, caído próximo à guerreira. Ele aponta para o túnel da direita.

Sir Cinnor: “Por ali! Por ali ou morrerão!”

Marion grita para os seus amigos e eles vêem um homem com as duas espadas incandescentes, saindo da lateral do seu elmo, se aproximar do Cavaleiro Cinnor e com uma espada lhe atravessar a espinha lhe arrancando um grito desesperado. Então eles ficam cegos pela luminosidade novamente. Eles tateiam cegos na direção que Sir Cinnor indicou até que acham uma passagem. A primeira a entrar é Lady Marion que se desequilibra e puxa Sir Enrick pra dentro seguido por Algar. Então eles caem...

Parece existir ali uma descida íngreme e eles rolam para baixo. Não existe nem cima nem embaixo. Eles sentem a dor dos seus corpos batendo contra as paredes do estreito túnel até que ficam em total breu. Sentem seus braços torcidos e recebem pancadas fortes por todo o corpo. Então... Tudo fica em silêncio.

Barão Algar: “Estão todos aí? Que dor! Foi uma longa descida.”

Lady Marion: “Estou! Enrick? Você está bem?”

Sir Enrick: “Acho que feri meu braço. Tem mais alguém aí? Acho que estamos em uma espécie de poço.”

Então tudo parece tremer. E lá de baixo eles escutam o som de uma explosão e sentem o calor irradiando pelas paredes. A luminosidade lhes cega e o som os ensurdece por alguns segundos. São ouvidos os gritos e sons de corpos se debatendo contra as paredes e silêncio novamente. Lá longe a luta continua e eles escutam o som do aço contra o aço da batalha diminuindo até que tudo parece ter acabado.

Sir Bag: “Tem alguém aí? É você guri? Mas alguém?”

Sir Enrick: “Sou eu Bag.”

Lady Marion: “Estou aqui.”

Barão Algar: “Eu também!”

Aí eles começam ouvir os gemidos de dor e o choro vindo lá de cima seguido por um rugido que vai crescendo, crescendo até que eles ouvem ao longe Sir Amig gritando.

Sir Amig: “Os túneis estão sendo inundados! Precisamos achar uma saída!”

Então o som da água chega pelos túneis aumenta e logo começa a invadir o lugar onde eles estão. A água salgada do mar começa a cair ali para baixo, bem gelada, como uma cascata mortal. Os heróis ficam com água pelo tornozelo. Eles sentem alguns cadáveres caírem lá de cima. Logo eles escutam mais uma voz.

Arina: “Quem está aí?”

Eles reconhecem a voz de Arina.

Arina: “Acho que eu estava desmaiada!”

Barão Algar: “Precisamos sair daqui! Rápido, procurem uma passagem nas paredes!”

Eles tateiam as paredes de calcário enquanto a água gelada sobe até os seus joelhos.

Barão Algar: “Achei uma porta! Aqui rápido! Bag e Enrick, ajudem!”

Sir Bag: “Rápido ou vamos nos afogar!”

Depois de sucessivos golpes Arina teteia Bag no escuro e o empurra para o lado.

Arina: “Sai gordão!”

Eles se lançam contra a porta mais uma vez, com as águas quase lhes cobrindo os ombros em total desespero, eles sentem o nível baixar. Vindo lá de cima a torrente diminui. Eles são empurrados pela pressão da água e caem em uma escadaria.

As chamas dos archotes iluminam uma escada que eles sobem rapidamente. Quando chegam no último degrau o nível da água, que espuma na cor verde, cobre quase toda a escadaria. Alguns cadáveres bóiam ali. Eles reconhecem o brasão dos guerreiros de Algar e um soldado de Sir Amig desfigurados pelo fogo. Então eles se dão conta que estão em um longo corredor de pedras no nível inferior do Castelo.

Lady Marion: “Meu pai! Meu irmão! Estão todos mortos.”

Barão Algar: “Calma Marion. Só nos resta fazermos uma coisa... Cumprirmos nossa missão.”

No final do corredor eles encontram uma escada em caracol. O grupo sobe e quando saem dela existe um outro corredor com quatro portas, três na direita e uma na esquerda. Eles se esgueiram tentando ouvir algo. Quando se aproximam da última eles escutam uma conversa.

Sargento: “Comandante, tivemos invasores! É a terceira vez nas últimas semanas. Despachei os línguas de fogo. Esses saxões são assassinos eficientes e estão treinando há semanas lá embaixo. Parece que muitos inimigos foram mortos. Só saberemos quando a água baixar. Acordo o príncipe senhor?”

Comandante: “Não vale a pena, ele pediu para não ser perturbado Sargento. Eram saxões de que Rei nos atacando dessa vez?”

Sargento: “Não dá para saber. Mas quando descobrir lhe aviso. O Príncipe pediu para que ficássemos atentos nesses dias porque teríamos mais visitas.”

Sir Enrick: “Arina e Bag! Atacaaaar!”

Arina prega o pé na porta enquanto Bag usa seu ombro. Ela voa em pedaços lá para dentro enquanto quatro homens os olham sem compreender o que está acontecendo. O sargento, careca e com várias cicatrizes no rosto, sem um dos olhos, se assusta e saca uma machadinha. Ele tem no peitoral o brasão do Rei Cerdic, com os dragões vermelhos e brancos pintados em um fundo negro. O Comandante, um cavaleiro com cinquenta verões se levanta sacando uma lança de duas pontas. Ele veste uma cota de malha e por cima um peitoral de aço. Existem dois guerreiros com eles sentados à mesa. Os dois se levantam e partem pra cima de Bag e de Arina. O sargento e o comandante chutam a mesa em cima de Sir Enrick, do Barão Algar e de Lady Marion.

A mesa quadrada voa acertando os dois Cavaleiros os atirando na parede no fundo da sala os ferindo e os derrubando. Marion gira no ar desviando do golpe e lançando sua boleadeira que enrola no pescoço do sargento e quebra o seu rosto no lado direito. Marion rola para trás dele sem dar tempo do homem reagir e com as suas adagas o degola pelas costas usando a sua adaga.

O Comandante usando a sua lança de duas pontas bloqueia um ataque de Algar o acertando e golpeia Sir Enrick passando a lâmina rente ao seu rosto. Então Enrick o acerta no ombro com o martelo de guerra. Ele cai para trás enquanto Marion salta no ar novamente e ataca o inimigo pelas costas o enforcando.

Um dos lanceiros ataca Arina que desvia do golpe e gira o martelo por cima de sua cabeça quebrando a arma de seu adversário. Então ela usa o cabo do martelo acertando a cabeça do homem que cai sentado. Então de cima para baixo ela gira o seu grande martelo de guerra e ela quebra o elmo, depois o crânio fazendo o maxilar do homem ficar pendurado, só por pele, escorrendo parte de seus miolos pela barba banhada em sangue. Bag com seu machado fica espantado com a guerreira e quando se distrai leva a lança em seu ombro. Ele faz uma careta de dor, larga o machado, quebra a arma do inimigo e com o pedaço ele fura o homem, na barriga, que grita. Ele tenta correr mas Bag segura-o pelo gorjal pelas costas. Até que Arina vem pela frente e lhe dá uma cabeçada e ele desmaia. Arina pisa no cabo enfiado na barriga do homem matando-o.

Sir Bag larga o cadáver e diz: “Pô Algar! Era meu duelo! Pô assim não dá! Fala aí pra ela.”

Sir Enrick: “Vejam o pergaminho, existem 1200 homens registrados nesse castelo.”

Subindo uma outra escada em forma de caracol eles chegam em uma porta. Ela está aberta. Um grande salão de banquetes decorados com esculturas de pedra de cavalos marinhos e conchas do tamanho de escudos adornam as paredes. Chama a atenção tapeçarias com Netuno soprando barcos em meio à uma tempestade. Do outro lado mais uma porta. Ela também está aberta. Eles seguem lentamente com as armas preparadas e entram num corredor que tem três portas. Duas na esquerda e uma na direita.

Algar entra na primeira à direita. Esse quarto está mergulhado nas sombras. As chamas dos archotes do corredor iluminam em parte o interior. Existe uma cama e uma lareira ali dentro. Do outro lado existe uma janela estreita em formato ogiva. Ninguém está ali. Algar observa o mar do lado oposto ao desembarque. Tudo está iluminado pela lua.

Eles seguem e entram no segundo quarto da esquerda. Eles enxergam três mulheres dormindo no chão, em cima de peles de urso, e duas crianças na cama. Parecem ser duas meninas com sete primaveras. Lentamente eles se retiram e seguem até a última porta da esquerda.

Ali existe o brasão com a torre no centro e os dois cavalos marinhos. Ao mexer na maçaneta ela abre. A lareira está acesa. Existe uma mesa com uma ânfora de vinho e chifres de ouro para tomá-lo. Do outro lado do quarto existe uma porta dupla grande. Em uma grande cama está o príncipe deitado. No pé da cama está um homem dormindo usando cota de malha com a espada ao alcance de sua mão. Uma mulher de cabelos negros está deitada com o príncipe. Ela está nua e ele coberto com uma pele de gado. Algar se aproxima com as mãos nuas preparadas para subjugar o saxão. Ele agarra o homem enquanto ele se debate. Sir Enrick e Lady Marion disparam os seus arcos e acertam a mulher e o guarda. Mas não mortalmente o que faz com que o protetor do Príncipe se levante sangrando e aos berros acerte com a espada as costas de Algar, rachando a sua cota de malha e cortando as suas costas. O Barão sente o sangue jorrar quente e uma dor lancinante. Então olha para o Príncipe saxão Cynric e sua nuca se arrepia enquanto o homem consegue se livrar dele. O homem é uma isca. Não é o príncipe. A mulher nua cai morta ao lado da cama enquanto Algar decapita o guarda que Sir Enrick tinha flechado.

Então um estrondo ocorre e da porta de onde eles vieram vêm três homens lado a lado com escudos. Eles entram em uma carga tentando derrubar Arina e Bag, mas não conseguem. Mas atrás deles vem uma torrente de soldados britânicos e saxões. Eles enchem metade do quarto. Os heróis vêem homens e sangue voando enquanto Arina e Bag lutam bravamente contra cinco, depois dez e doze guerreiros. Do outro lado a porta dupla se abre e o mesmo acontece e dezenas de guerreiros entram ali precedidos por uma parede de escudos tripla e que vai ficando maior os cercando. Existem outros escudos barrando as duas portas pelo lado de fora. Arina e Bag apanham muito e cheio de hematomas no rosto são atirados no chão e dez lanças pressionam seus corpos.

Comandante Inimigo: “Joguem as armas ou eles morrerão!”

Sir Bag de quatro cuspindo sangue e três dentes olha para seus amigos com o olho fechado por um hematoma.

Sir Bag: “Desculpem!”

Os heróis jogam no chão as suas armas imediatamente.

Saindo lá de trás surge o verdadeiro príncipe. Usando uma manopla de ferro prateada e capa verde, com cabelos pretos longos crespos e traços fortes, com uns vinte verões.

Comandante inimigo: “Pode vir príncipe! Está seguro agora!”

Príncipe Cynric: “Obrigado Comandante. Vocês estão presos em nome do Rei Cerdic de Wessex e do Rei de Nohaut, Beorthric, o sem joelhos! Acredito que vocês tenham uma dívida a pagar à ele. Comandante, joguem esses malditos Britânicos nas Masmorras da Lua. Ah, ia esquecendo. Pague o Arcebispo em dobro... ele nos foi bastante útil.”